gata-borralheira

Eu sempre fui meio nômade. Ou talvez, pra ser mais sincera, eu sempre vivi a esmo demais pra me amarrar a alguma coisa que pudesse por em risco a minha independência. No começo, era só mais uma forma de correr contra o tempo, mas aos poucos a corrida acabou se transformando numa fuga e a fuga no meu próprio cárcere. O fato é que nunca tive muito medo de abandonar tudo e ter que ir embora; e gradativamente isso fez com que eu me tornasse escrava da minha própria liberdade. Porque o meu destino é o acaso, o meu impulso é a raiva e os meus sonhos viram poeira antes mesmo que eu consiga transcrevê-los. Não sei ser discreta, simpática, muito menos espontânea e o melhor conselho que alguém pode me dar é um abraço. Às vezes confundo confiança com dependência e costumava ver o amor como uma espécie de cabo-de-guerra onde eu devia fazer por merecer até a lama... É que pra ser mais exata, a minha estabilidade é a corda bamba e o meu limite é justamente esse, as reticências (..)

veneno orgânico

Sei lá. De duas, uma: ou eu fui muito fudida na minha outra vida, ou eu casualmente nasci na espécie errada. É sério. É como se às vezes, eu meio que parasse de ser pela metade. Entende? E que Raul Seixas não me ouça, mas essa coisa de “metamorfose ambulante” em certos dias me desgasta tanto, que eu acabo parecendo mais um estepe de mim mesma, no melhor estilo da substituta que entra em cena quando os outros pneus furam. É um egoísmo meio estranho, mas às vezes eu só queria.. sei lá, me sentir eu mesma sem ter que me dividir com as outras caras que o espelho não mostra. Você entende? Porque eu até consigo ser mil, mas no final é só a velha e amarga sensação de ser só mais uma. Uma caloura um pouco boba e infantil que quase nunca sabe ao certo como é ser humana.

até que a vela queimou-se toda..

Eu procurei a forma mais certa de te convencer, mas as minhas explicações soam tão embaralhadas e difusas quanto às gotas de chuva que embaçam a janela do meu quarto (...) Eu achei que não fosse preciso desmentir tudo, mas é quase fácil demais cair em tentação quando não há mais mistérios. Eu só quis brincar um pouco de passado e achar uma saída pra nós dois nesse ritmo bom de ilusões adocicadas. Entende? É que às vezes, a gente precisa de um descanso da vida real e eu sou uma boa desculpa pra você escapar da realidade... Vontade de romper, eu também tive. Mas lá no fundo, alguma coisa me disse que tudo bem, eu podia ficar se eu quisesse. E foi isso mesmo que eu quis: ficar. Porque o seu sorriso é o meu melhor esconderijo. E eu deixei você livre para brincar com a minha liberdade. Eu te entreguei a minha alma e você quis o meu coração. Eu só queria que você entendesse que isso da gente sentir orgulho um do outro nunca fez muita diferença pra mim. Entende? Porque no final só sobra aquele silêncio constrangido e esse nó que comprime o peito e estrangula a expectativa de “não poder evitar”. E eu sinceramente não vou conviver com esses rastros mal feitos e acusadores. Mas não se preocupe. É uma pena o fato de para você eu não ter sido nada além de um objeto na sua vã coleção de erros e desgostos. Mas não se preocupe. Eu tenho uma vida pra viver e nós temos tempo de sobra pra gastar. Prazer, o meu mais novo nome é desapego.