fogo por fogo

Eu sempre tentei ser mais sonora do que o meu próprio silêncio pra não sucumbir na tristeza que é ser sozinha. Entende? Só que a gente só cresce quando assume a responsabilidade de ser quem a gente realmente é. E eu continuo aqui cheia de defeitos. Às vezes me deixo arrastar por entre essas brevidades de alguns intervalos em que eu paro pra olhar com menos susto o quão assustador isso tudo ainda me soa. Como se eu pudesse assim, me manter na superfície disso tudo. Como se eu ainda pudesse deixar os limites todos claros outra vez. Como se o tempo ainda esperasse pra ser tempo. E não cura, não bálsamo, não espera ou desculpa. Só tempo (..) Então eu abro a janela, o olho, a alma e o coração pra ver se essa tristeza vira verão e faz sol aqui também...

paródia de nós

Você foi o típico acidente de propósito. Meio esquerdo. Meio errado. Meio como um equilíbrio vertical pra eu nunca precisar colocar os pés no chão outra vez. É que eu sempre fui mais plural sendo sozinha, entende? E eu nunca percebi quando foi que a nossa história me escapou por entre os dedos. Quando foi que eu comecei a entrar no seu jogo pra fazer as minhas próprias regras. Porque eu sempre fui muito pequena e agora o mundo todo parece caber dentro de mim. Consigo até tocar as estrelas mesmo sem nunca ter tido tamanho pra tanto (...) Vem buscar o amor que você deixou aqui no meu peito. Corrompe a métrica do meu compasso e rouba o meu coração só mais uma vez. Sustenta minhas mentiras pra eu poder me convencer da tua veracidade. E me prende, me aperta, me cerca nos teus braços só pra eu nunca mais perder a minha liberdade.

A gente seria a confusão mais bonita se a gente fosse pra sempre.

o último andar

(...)


É só que às vezes, eu ainda gosto de ter o controle sobre determinadas coisas, entende? E no entanto, parece que a única maneira de deixar que uma coisa se eternize, é deixando que ela se vá. Para sempre.

além-mundo

Deixei-me arrastar pelo tempo simplesmente por não poder mais resistir à eternidade que vive a roubar minha finitude. Eu tenho pressa e corro com a imprudência de quem carrega o desespero nos olhos. Deixo palavras pela metade e prefiro continuar calada, fazendo companhia pro meu silêncio. É só que talvez, em algum momento, eu precisei extravasar algum tipo de limite pra conseguir criar as minhas próprias fronteiras, entende? Então eu devoro o cetro só pra não arranhar a minha suscetibilidade. Porque eu não quero mais ter que ir embora toda vez que o meu coração sucumbir. Porque mesmo que isso signifique nunca mais ter os pés no chão outra vez, é a conseqüência mais óbvia pra deixar as coisas todas no lugar.

debaixo das pálpebras

Talvez, seja mesmo uma questão de tempo. Como se eu pudesse fechar os meus olhos e deixar certas coisas no passado apenas conjugando verbos em um presente distante. E eu preciso admitir que às vezes, as coisas se tornam mais fáceis dessa maneira. Porque o lado bom de tudo isso foi justamente ter saído em desvantagem. Essas coisas sempre são obvias demais pra gente perder tempo com coincidências. E sinceramente? Eu cansei de ter que merecer primeiro pra depois poder gostar de alguém. Desculpa te decepcionar.

quarta-feira

A racionalidade nunca foi o meu forte. Eu sempre fui um tipo de pessoa que precisa se camuflar pra poder aparecer e ser racional pra mim sempre significou agir com o coração. E agora, pareço engraçada tentando encontrar as palavras certas pra tentar me desculpar por todas as coisas erradas que tenho feito. Porque quanto mais o círculo se fecha, mais espaço eu ganho, entende? E eu levei muito tempo pra aceitar as coisas como elas realmente são. Foi preciso que eu aprendesse a me doar de um jeito diferente. Porque às vezes é preciso parar pra correr contra o tempo. E eu precisava disso, precisava mudar pra continuar sendo eu mesma, entende?

consoantes

O papel sempre foi o meu espelho. Meu disfarce pra eu ser um pouquinho mais de verdade, entende? Eu improviso palavras como quem inventa desculpas. E ensaio rimas a procura de rumos. Às vezes, é como se a minha vida fosse uma espécie de livro pautado no qual eu não consigo escrever sobre as linhas, entende? E a minha história parece ter virado uma história de reticências. Uma história de pontas soltas a amarrar (...)

versus você

(...)


Até nos lugares mais improváveis, nos olhares mais dispersos ou até quem sabe, no avesso do mundo onde o tempo corre com menos pressa pra gente poder descansar da realidade... Em cada linha, verso ou parágrafo mais avulso (...) no fim é sempre você quem eu encontro. Você está em todos os lugares e eu só queria que estivesse aqui, do meu lado. Você, que tem pólvora nos olhos e estrelas escondidas debaixo dos pés.

nas entrelinhas

Em pouco tempo o tapete ficou coberto pela pilha de papeis amassados que ela, com raiva, arremessava contra a parede. Era sempre assim. Ela sempre terminava se desfazendo em palavras, mesmo quando essas já não surtiam mais efeito algum. Por bem ou por mal, ainda tentava em vão ganhar credibilidade entre as palavras e quem sabe conseguir domesticar um caos que entre linhas reconstruía a mesma história em forma de paródia. Com desaforos em letras maiúsculas e tudo. E foi entre um verso de neutralidade e equilíbrio, que a estabilidade ganhou voz pra cantar um desespero mudo em tom de zombaria. No superlativo. E era só insegurança que perde a inspiração e usa da expressão pra se fazer valer. De prolixo direto pro lixo. Mais uma vez em sigilo. E de repente, ali, no chão da sala, envolta por sílabas sem brilho, descobriu que TENTAR era um verbo que ela já não conjugava mais. Em tempo nenhum.

primeiro de abril

(...) mas eu não poderia me fazer enganar nem mesmo no único dia em que as minhas mentiras poderiam ser perdoadas.

Ininterrupto

Em algum momento os joelhos sucumbiram ao peso do corpo e então ela parou. Parou de correr como se de repente houvesse descoberto que nunca houve de fato uma corrida e que era mesmo por tanto correr que continuava sempre no mesmo lugar. Estagnada na própria existência.

Talvez, só tivesse medo de descobrir que ela toda era uma farsa.

lágrimas de aquarela

Sabe o que é mais engraçado na rotina do destino? A ironia.
Eu até poderia ter me arrependido se tivesse ganhado um pouco mais de tempo. Mas, eu cansei de ser a propaganda das minhas próprias promessas. E o meu silêncio é ausência que eu não quero mais escutar. Não me leve a mal. Vou continuar brincando de ser dona do meu nariz e quem sabe dessa vez, talvez eu me lembre de criar asas (...)

vice e versa

Tudo começa com o que não foi dito, o que ficou subtendido. Inconsciente. É debaixo de um sorriso que se esconde a insanidade. Me disseram pra esperar, confiar no destino. Mas eu não posso. Isso seria compactuar com a minha ansiedade. Arriscado demais. E eu admito, não sei fingir. Não sei o momento exato de dizer, de estar, de sentir. De parar. É impulso, improviso. Cauculado e desimpedido. E Ilusões provisórias acabam machucando mais do que planos inacabados. E eu admito mais uma vez: não sei fingir. Preciso de um ponto de fuga. Quinze minutos de pura eternidade.

entrelinhas

(...)

E eu, que sempre gostei de re-começar, não sei mais como dar o primeiro passo. Porque toda vez que eu tento avançar e me aproximar mais um pouco, é como se alguma coisa me rebobinasse pro fim. De novo. Entende?

reticências

O meu relógio tá com arritmia, enquanto o meu coração já quase não se faz sentir quando pulsa. E eu vivo assim, pelos cantos, com os fones no ouvido... E quando anoitece, eu aumento um pouco mais o volume pra não ouvir essa ausência que tanto me ensurdece. E acendo todas as luzes da casa, pra ver se quem sabe, isso faz com que as coisas se tornem um pouco mais claras toda vez que o silêncio tentar fingir que não temos mais tanto assim pra dizer.