sufrágil de plástico

Talvez eu tenha mais para dizer do que as palavras me permitam, mas não quero lamentar nada nem tampouco descobrir (in)limitações perdidas enquanto escrevo... São dias esfumaçados e quase ausentes, passo mais tempo fora de órbita do que me seria permitido e quase não me dou conta. Voltar para casa ainda me soa seguro e garantido, mesmo que a cada dia o caminho de retorno pareça ainda mais extenso do que me foi no dia anterior. E é com gula que me recrimino, com a ausência e o maldito medo de ir além dos olhos. E revido essa ânsia e esse demônio de auréolas que me rasga o íntimo para me compensar na urgência que vivo e no desuso em que espero o não-chegar. Isso tudo que quase chega a ser alarme, mas se parece mesmo é com alegria. Essa suspensão desconfortável e todas as separações provisórias. A excelência dos riscos. A boca ultrajada do céu e do inferno. E essa mixórdia de sentimentos e sensações mnemônicas que me postergam e me antecedem, como o rato ofendido que atrevidamente me cospe na cara a chaminé que me habita debaixo do peito... E são os detritos que sagram os vencedores dessa vez. E eu me lambuzo toda na imundície disso tudo para me purificar... Então me abasteço desse pedaço de passado aplacado para pendurar outras dores escondidas, num deixar-se ir de sonhos instantâneos e despedidas extensivas. E me esqueço um pouco do quanto é insano e doentio tudo isso e como inevitavelmente essas coisas acabam conseguindo vencer a resistência do ar para me fazer sair do chão toda vez que eu finjo não ver. Até eu, anjo de asas tortas que mesmo depois de tanto tempo ainda poupo um coração que mais parece um campo minado em guerra. Eu, que de repente vivo esburacada de tantos vãos que me abro para poder ser mais um pouquinho. E crio tanta coisa para me consentir invadida que quando a chuva passa meus arco-íris por fim renascem das cinzas e o dia finalmente muda de cor. E pensar que nada mais disso me importa. Porque somos todos feitos de defeitos. Até eu, gata borralheira sem encanto, que só vou lembrar de sonhar quando enfim já é meia noite e a madrugada já se encarregou de transformar meus gritos internos em ruídos surdos pro dia poder nascer e eu passar a existir outra vez.

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